terça-feira, 26 de maio de 2015

Do nada, nada se cria

Quanta vida foi necessária viver para entender que nada se cria do nada. 
Eu olhei por muito tempo, embevecida, as vitrines da vida, as criações que encantavam e ignorei o longo caminho que se leva para uma ideia criativa aparecer. Achava que alguns nasciam simplesmente iluminados. Não é bem assim! 
Antes de uma grande inspiração, invenção ou criação que mudou o curso da história, houve uma jornada de outros tantos que vieram fazendo tentativas,  muitas vezes colhendo muitos fracassos. E sequer vão aparecer na foto junto com quem finalizou o trabalho. 
Mas esses seres merecem sempre reverência. Por nunca desistirem.
Hoje sei que quem fez a diferença, não foram os geniais, mas sim os persistentes e que nem os iluminados tiraram  luz do vácuo. Alguém começou com um primeiro, passo e outro aperfeiçoou mais um pouquinho, em seguida, outro acrescentou algo mais e um dia a luz se fez.
Portanto, desistir não vai fazer com que algo cai pronto nas mãos de ninguém. Se queremos algo, vamos ter que aprender a viver com os erros, nos perdoarmos por eles, seguir em frente e continuar buscando.



(Fonte da imagem: http://www.conscienciaampla.com.br/wp-content/uploads/2014/01/lampada-acesa-2703.jpg)

domingo, 24 de maio de 2015

Coisas lá de Minas

Só agora, consigo valorizar essa situação de mineira. Aos onze anos eu e minha família nos mudamos para interior do Rio de Janeiro. As crianças que de nada têm de puras e doces, passavam tempo todo rindo do meu jeito de falar. E quando eu ia pra Minas, me achavam esnobe porque o sotaques já estavam todos misturados. Levaram cerca de três décadas para eu perceber que não havia cultura superior ou inferior, apenas culturas diferentes.
Andei meio "despatriada" por tempos porque não me situava em lugar algum, curiosamente, fui encontrar-me mineira em São Paulo, onde todos os diversos se reúnem. Foi lá que aprendi a comer pão de queijo e a comer pamonha. 
Ás vezes é preciso estar longe para ver melhor.
Hoje busco saber mais sobre minha gente, sobre seus costumes. Acho graça com lembranças de crendices praticadas só lá.
Cada lugar tem peculiaridades só suas e Drummond resolveu ressaltar o sotaque da mineira.  Eis o texto a seguir:


O sotaque das mineiras .

 Carlos Drummond de Andrade

O sotaque das mineiras deveria ser ilegal, imoral ou engordar. Porque, se tudo que é bom tem um desses horríveis efeitos colaterais, como é que o falar lindo (das mineiras) ficou de fora?
Porque, Deus, que sotaque!
Mineira deveria nascer com tarja preta avisando:
ouvi-la faz mal à saúde. Se uma mineira, falando mansinho, me pedir para assinar um contrato doando tudo que tenho, sou capaz de perguntar: só isso?
Assino achando que ela me faz um favor.
Eu sou suspeitíssimo. Confesso: esse sotaque me desarma. Os mineiros têm um ódio mortal das palavras completas.
Preferem abandoná-las no meio do caminho, não dizem:
pode parar, dizem: 'pó parar'.
Não dizem: onde eu estou?, dizem: 'ôncôtô'.
Os não-mineiros, ignorantes nas coisas de Minas, supõem, precipitada e levianamente, que os mineiros vivem lingüisticamente falando, apenas de uais, trens e sôs.
Digo-lhes que não.
Mineiro não fala que o sujeito é competente em tal ou qual atividade.
Fala que ele é bom de serviço.
Pouco importa que seja um juiz ou jogador de futebol.
Mineiras não usam o famosíssimo 'tudo bem'.
Sempre que duas mineiras se encontram, uma delas há de perguntar pra outra:
- 'Cê tá boa?'.
Para mim, isso é pleonasmo.
Perguntar para uma mineira se ela tá boa é desnecessário.
Há outras. Vamos supor que você esteja tendo um caso com uma mulher casada.
Um amigo seu, se for mineiro, vai chegar e dizer:
- 'Mexe' com isso não, sô (leia-se: sai dessa, é fria, etc.).
O verbo 'mexer', para os mineiros, tem os mais amplos significados..
Quer dizer, por exemplo, trabalhar.
Se lhe perguntarem com o que você mexe, não fique ofendido.
Querem saber o seu ofício.
Os mineiros também não gostam do verbo conseguir.
Aqui ninguém consegue nada.
Você não dá conta.
'Sôcê' (se você) acha que não vai chegar a tempo, você liga e diz:
- 'Aqui', não vou dar conta de chegar na hora, não, 'sô'.
Esse 'aqui' é outro que só tem aqui.
É antecedente obrigatório, sob pena de punição pública, de qualquer frase.
É mais usada, no entanto, quando você quer falar e não estão lhe dando muita atenção.
É uma forma de dizer:
- Olá, me escutem, por favor.
É a última instância antes de jogar um pão de queijo na cabeça do interlocutor.
Mineiras também não dizem apaixonada por.
Dizem, sabe-se lá por que, 'apaixonada com'.
Soa engraçado aos ouvidos forasteiros.
Ouve-se a toda hora:
- Ah, eu apaixonei 'com' ele...
Ou: Sou doida 'com' ele (ele, no caso, pode ser você, um carro, um cachorro).
Elas vivem apaixonadas com alguma coisa.
Que os mineiros não acabam as palavras, todo mundo sabe.
É um tal de 'bonitim', 'fechadim', e por aí vai.
Já me acostumei a ouvir:
- E aí, 'vão?'. Traduzo:
- E aí, vamos?
Não caia na besteira de esperar um 'vamos' completo de uma mineira.
Não ouvirá nunca.
Eu preciso avisar à língua portuguesa que gosto muito dela, mas prefiro, com todo respeito, a mineira.
Nada pessoal.
Aqui certas regras não entram.
São barradas pelas montanhas.
Por exemplo, em Minas, se você quiser falar que precisa ir a um lugar, vai dizer:
- Eu preciso 'de' ir.
Onde os mineiros arrumaram esse 'de', aí no meio, é uma boa pergunta.
Só não me perguntem. Mas que ele existe, existe.
Asseguro que sim, com escritura lavrada em cartório. Deixa eu repetir, porque é importante.
Aqui em Minas ninguém precisa ir a lugar nenhum.
Entendam...
Você não precisa ir, você precisa 'de' ir.
Você não precisa viajar, você precisa 'de' viajar.
Se você chamar sua filha para acompanhá-la ao supermercado, ela reclamará:
- Ah, mãe, eu preciso 'de' ir?
No supermercado, o mineiro não faz muitas compras, ele compra um 'tanto de coisa'.
O supermercado não estará lotado, ele terá um 'tanto de gente'.
Se a fila do caixa não anda, é porque está 'agarrando' lá na frente.
Entendeu?
Agarrar é agarrar, ora!
Se, saindo do supermercado, a mineirinha vir um mendigo e ficar com pena,  suspirará:
- 'Ai, gente, que dó'.
É provável que a essa altura o leitor já esteja apaixonado pelas mineiras.
Não vem 'caçar confusão' pro meu lado.
Porque devo dizer, mineiro não arruma briga, mineiro 'caça confusão'.
Se você quiser dizer que tal sujeito é arruaceiro, é melhor falar, para se fazer entendido, que ele 'vive caçando confusão'.
Para uma mineira falar que algo é muitíssimo bom vai dizer:
- 'Ô, é sem noção'.
Entendeu?
É 'sem noção!
' Só não esqueça, por favor, o 'Ô' no começo, porque sem ele não dá para dar noção do tanto que algo é sem noção,
entendeu?
Capaz...
Se você propõe algo ela diz:
- 'Capaz'!!!
Vocês já ouviram esse 'capaz'?
É lindo.
Quer dizer o quê? Sei lá, quer dizer 'ce acha que eu faço isso!?'
Com algumas toneladas de ironia...
Se você ameaçar casar com a Gisele Bundchen, ela dirá:
-'Ô dó dôcê'.
Entendeu?
Não?
Deixa para lá.
É parecido com o 'nem...'.
Já ouviu o 'nem...?
' Completo ele fica:
- Ah, 'nem'...
O que significa?
Significa, amigo leitor, que a mineira que o pronunciou não fará o que você propôs de jeito nenhum. Mas de jeito nenhum.
Você diz:
- Meu amor, 'cê' anima 'de' comer um tropeiro no Mineirão?
Resposta:
- 'Nem...'.
Ainda não entendeu?
Uai, nem é nem.
A propósito, um mineiro não pergunta:
- Você não vai?
A pergunta, mineiramente falando, seria:
- 'Cê' não anima 'de' ir?
Tão simples.
O resto do Brasil complica tudo.
É, ué, cês dão umas volta pra falar os trem...
Falando em 'ei...'.
As mineiras falam assim, usando, curiosamente, o 'ei' no lugar do 'oi'.
Você liga, e elas atendem lindamente:
- 'Eiiii!!!', com muitos pontos de exclamação, a depender da saudade...
Tem tantos outros...
O plural, então, é um problema.
Um lindo problema, mas um problema.
Sou, não nego, suspeito.
Minha inclinação é para perdoar, com louvor, os deslizes vocabulares das mineiras.
Aliás, deslizes nada.
Só porque aqui a língua é outra, não quer dizer que a oficial esteja com a razão.
Se você, em conversa, falar:
- Ah, fui lá comprar umas coisas...
- 'Que' s coisa?' - ela retrucará.
O plural dá um pulo.
Sai das coisas e vai para o que.
Ouvi de uma menina culta um 'pelas metade', no lugar de 'pela metade'.
E se você acusar injustamente uma mineira, ela, chorosa,confidenciará:
- Ele pôs a culpa 'ni mim'.
A conjugação dos verbos tem lá seus mistérios, em Minas.
Ontem, uma senhora docemente me consolou:
'preocupa não, bobo!'.
E meus ouvidos, já acostumados às ingênuas conjugações mineiras, nem se espantam.
Talvez se espantassem se ouvissem um: 'não se preocupe', ou algo assim.
A fórmula mineira é sintética.
E diz tudo.
Até o tchau, em Minas, é personalizado.
Ninguém diz tchau pura e simplesmente.
Aqui se diz: 'tchau pro cê', 'tchau pro cês'.
É útil deixar claro o destinatário do tchau.
Trem bão tambem demais sô....

INVEJA

Eu sou invejosa!
Qual não foi a surpresa que tive ao descobrir o quanto posso ser invejosa!
Segundo Leandro Karnal, que fala de forma muito clara em sua palestra sobre a inveja, ela seria um pecado envergonhado, já que ninguém quer confessar. Se orgulham da luxúria, da gula e até da preguiça. Mas inveja? nunca!
A inveja e cobiça são diferentes. Depois de bem explicadinho, não parece tão mau que desejemos ter algo que o outro alcançou, mas é realmente reprovável se entristecer com a alegria de outro. 
Ninguém está livre de sentir inveja, é o único consolo que me resta por ser invejosa, não ser a única. O problema é ignorar tudo isso , ou negar. Quando você toma consciência da inveja que mora em você, começa a prestar atenção e a questionar seus julgamentos. E então aquela pessoa passa a não ser bem daquele jeito que você poderia jurar que era. 
Dr. Ivan Capelatto nos relata que a inveja está presente desde que somos bem pequenos, quando por exemplo, uma criança por volta de um ano e meio cheia de brinquedos, mas não está brincando com nenhum. Mas se chegar outra e encontrar um que goste, logo será repreendida pelo dono do brinquedo que mal sabe falar, mas dirá "meu". Muitos pensariam que isso é posse, mas na verdade já é a inveja se manifestando em tenra idade.
É triste admitir que invejamos. Porém pior é não aprender a lidar com isso e tornar o seu próprio mundo e o dos outros infernal por um sentimento de tristeza, pelo que o outro conquista, ou mesmo já tem por compleição.
A seguir deixo um vídeo que nos dão mais embasamento teórico sobre esse tema. É uma palestra que apesar de ter um pouco mais de duas horas de duração, elas nos traz momentos de reflexão e riso. Dr. Karnal tem um humor refinado.





O dom

Hoje tive de sair cedo, numa empreitada, nova de vida aos 41 anos, encarar o trânsito numa scooter. Ainda tenho reminiscências do terror que era pensar em pegar no volante. Foram longos seis anos desde que peguei a habilitação e enfim encarei a estrada. Depois de treino e mais treino na auto-escola. Já li que há uma correlação de como dirigimos a vida e encaramos a direção de um carro. Lastimável ver quem em alguns momentos a nossa vida se revela caótica. Mas o importante é não desistir.
Vou continuar enfrentando o trânsito. Agora num arremedo de moto elétrica de criança, só que para adultos.
Porém essa nova situação me fez pensar em outras tantas da vida e no motivo que dei esse título ao blog: Não era bem assim. Por muitas vezes me senti frustrada ou diminuída, por que via as pessoas conseguirem fazer coisas ordinárias , no sentido de comuns, e pra  mim, uma imensa dificuldade. Pessoas, que à vezes nem se davam ao trabalho de refletir sobre o que estavam fazendo e faziam muito bem. Enquanto eu, que pesquisava, buscava métodos de melhorias, total fiasco!
Um dia, na minha eterna busca poe esclarecimentos, assistia uma palestra no youtube, do Dr. Mário Sérgio Cortella, infelizmente agora não me recordo qual, mas ele tratava da questão do dom a certa altura da palestra. E contava que o Pelé, em suas extraordinárias atuações,  contava com um dom, o Dondinha, o seu pais, que após os treinos o fazia ficar mais duas horas treinando jogadas e olhar direto para o sol, para que não perdesse cabeciadas em dias que fosse jogar com o sol a pino.
Aqueles grandes oradores que conseguem prender minha total atenção enquanto falam , muitas vezes de coisas corriqueira, que eu poderia ter fácil informação, no entanto, eles deram uma roupagem tão bonita... Nenhum deles sequer nasceu sabendo falar. Ou seja, houve um longo tempo de preparo, de insistência em melhorar.
Assim deveria ser nossa postura diante da vida.Talvez o grande problema seja essa velocidade exigida nos tempos atuais, não nos permitem muitas tentativas, querem tudo para ontem.  Contudo sempre que encontrar alguém lamentando suas dificuldades ou alegando incapacidades, vou dizer: se eu consigo, se tantos por aí com menos habilidade, e até deficiência conseguem, você também pode. Tem que insistir. Pode ser que precise dar uma parada para tomar fôlego, mas precisa insistir.